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Cinescópio Cinco - Março\Abril de 2017

Depois de horas - domingo dia 9.4 às 19 horas - ENTRADA E LIVRE - TRIBUNA LIVRE CULTURAL

1.

O movimento e desconforto em Depois de Horas

 

 

por

Taísa Bezerra

(descobridora de mundos possíveis)

 

         De tantos filmes do diretor Scorsese, esse  se constitui como o mais belamente estranho, desconfortável e genial ao meu ver. Foge de tudo que estamos acostumados vindo do diretor e isso causa um espanto  tamanho. Quando me deparei com esse filme, de cara pensei “estou ficando sufocada”.  A aflição de não poder ajudar o personagem causa uma angustia  enorme. Tal qual no Mito de Sisífo, que se constitui em Sísifo executar a  mesma tarefa de empurrar uma pedra até o topo de uma montanha e toda vez que quase alcançava o topo, a pedra rolava novamente montanha abaixo, invalidando completamente o duro esforço despendido,  Paul, protagonista do filme, se encontra totalmente preso no tempo, que de certa forma o impossibilitava de ter uma autonomia diante suas escolhas e ações.

 

          Diante disso, o telespectador vai acompanhado o mesmo nessa viagem pelo submundo de Nova York. O processo de identificação do telespectador com o filme ocorre quando percebemos que o personagem se  encontra em uma vida totalmente limitada, pautada em lidar com máquinas em uma rotina exaustiva que o mesmo parece detestar. A dinâmica entre o viver e morrer se encontra presente em todos instante e os pequenos detalhes de cada acontecimento  se concretizam como definidores para a mudança de toda a estética do roteiro.

                                                   still do filme

 

           Ansiedade, paranoia, vertigem,  perseguição, desorientação  aparecem como sensações principais onde  depois da meia noite toda as regras sociais parecem mudar diante as ruas da cidade. Podemos nos perguntar até quando o trabalho moldará a vida do homem, que como um grito de apelo faz Paul durante uma madrugada se aventurar.

Suicídio,roubo,assassinato. Nesse grande teatro social, cada personagem vai se edificando como definidores para que naquela noite Paul não consiga retornar a sua casa.

 

       O quanto a a fuga da nossa rotina nos desespera? O quanto os imprevistos podem afetar a nossa sanidade?

        Tudo se encontra em movimento o tempo inteiro desde o jogo de imagens, a trilha sonora, até a dinâmica dos personagens e é  esse movimento faz Paul seguir, é esse movimento que nos mostra como na vida comum somos bárbaros. Desde um grupo de justiceiros que perseguem o personagem por crimes que o mesmo não cometeu, até quando tem sua cabeça quase raspada involuntariamente. Sei que podemos aprender diante essas cenas muito sobre conservadorismo, muito sobre o mundo que vivemos e ainda mais sobre nós mesmos.

 

A última esperança

A última moeda

A última ligação

 

        O filme nos transmite que o personagem está sempre caminhando em uma corda bamba na qual os eventos moldam sua personalidade mas para além disso, moldam nossas expectativas diante até onde ele conseguirá aguentar, como se a vida um grande teste de sobrevivência. Dado momento do filme, Paul consegue ligar para a polícia, querendo mostrar que sua vida corre perigo, e como resposta, dizem que ele está louco. Naquele momento Paul se encontrava sem apoio de amigos, da família e do Estado.

 

     “Por que comigo? POR QUE EU?  Sou apenas um operador de computadores!”

 

          Exclama apontando para o céu, na última esperança de aclamar por um Deus que lhe ajudasse.

 

         Scorsese nos mostra uma Nova York devastada, onde o crime está institucionalizado, nos mostra também a cena Punk e a classe artística daqueles tempos tudo isso com um toque de surrealismo e personagens com estéticas totalmente fora dos padrões imaginados. Nessa dança entre o real e o surrealismo dos acontecimentos, descobrimos o quão frágil a mente humana é e o quanto estamos procurando sem procurar.

            Novamente a angustia paira sob nossas costas, novamente nos bate o sentimento de impotência diante as situações. Que angustiante é viver onde essa rotina te prende e a fuga dela te prende mais ainda.

       Se nos entregamos é com a esperança da descoberta, mas que caminhada difícil!

            Vamos caminhando com Paul para no final chegarmos a lugar algum.

          Será que realmente falta algo que nem Paul e nem nós conseguimos enxergar?

 

 

 

 

 

 

 

 

 

            

                                                             

                                                           

                                                                  still do filme

 

 

      Não sei se enxergamos as injustiças ou nós só a fazemos sem nos preocuparmos no movimento que a mesma provoca. Sei que sentimos e por sentimos elas existem.

        Paul é a representação do eu na vida cotidiana, é a representação de nós todos presos em nossas rotinas, é a representação do que não queremos representar. Todos temos um pouco de Paul e um pouco dessa sociedade que Scorsese tentou nos passar. E para além dessas identificações, fica a reflexão de qual seria o limite entre nossa impotência diante ao rumo de nossas escolhas e toda a inconsistência da vida comum.

​​​​​​DEPOIS DE  HORAS

Martin Scorsese - 1985 - 93 min.

Sinopse: Paul, um operador de computador, conhece e sai com uma garota estranha, que mora no bairro do Soho, em Nova York. Após o encontro, ele passa por uma série de imprevistos e situações que o impedem de voltar para casa.

 

 

 

 

​por

Rajnia de Vito

(Aspirante a devires)

            Tento me expressar aqui como o faria para o mais íntimo dos amigos, apesar de não ser capaz de fazê-lo com os meus próprios amigos e irmãos. Penso que falar sobre amor e especialmente sobre o primeiro amor deve ser feito assim. Como uma confissão até que o ar acabe.O filme Adeus, primeiro amor (Um amour de jeunesse) da diretora Mia Hansen-Løve, de 2010, é simples, com poucos personagens, voltado para dois momentos da vida da jovem Camille. De início, ela é uma personagem que você sequer simpatiza. Ela é o que você não gostaria de ser. Ela é Penélope. Suplica a Ulisses que fique ou sua dor será tamanha que a levará a jogar-se no Sena. Creio que sequer somos apresentados aos outros personagens por nome. No mundo dos primeiros amores, só há o uno-duplo, euvocê-eu e você.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

                                                

                                                                                 

                                                                          still do filme

 

 

          No momento da partida de Sullivan, o Ulisses de nossa história, Camille está em posição fetal na cama. Jaz quase morta, sobre o molhado de seu lençol. O espectador se vê num espelho, remetido àquela relação sem a qual achava que não sobreviveria. Vemos a nós mesmos como hoje negamos. Sobrevivemos, afinal. Cá estamos. Olhamos agora acreditando que nada daquilo foi real, mas fruto da mente infantil de uma jovem apaixonada, que amando pela primeira vez, tenta se agarrar a sua ficção, ao seu papel de personagem principal num grande romance.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

                         

                                                                          

 

 

                                                                                 still do filme

 

                 

     No segundo tempo, encontramos a Camille mais forte, mais independente, conhecendo-se melhor, amadurecendo, com um novo e ousado corte de cabelo. Até que Ulisses retorna. De início, não queremos acreditar que aquele amor, aquele sentimento bobo e juvenil, todavia poderia nos afetar. Já aprendemos. Certo?

         Quando nos damos conta, lá estamos, mais uma vez, na mesma relação, ocupando o mesmo lugar, sendo Penélope, ou Camille. A vida parece impor seus ensinamentos aos quais não queremos e não sabemos nos render. Somos apreendidos (ou escolhemos ser apreendidos) pela inexorabilidade do destino. Tais como fôssemos personagens de tragédias gregas. Já seguimos esse caminho, sabemos onde ele geralmente leva, mas continuamos. Quando vai superar esse amor? questiona a mãe de Camille. A pergunta talvez se encontra não no amor, mas em nós mesmos. Quando nos superamos? Ou melhor, quando nos conhecemos de verdade? Em que ponto se conhecer é verdadeiro? Conhecer a seus próprios truques, mentiras, ilusões, auto sabotagens? E, ainda mais impossível, como conhecer a você mesmo e às suas diferentes identidades, diferentes devires, para que possa escapar à fatalidade, para que possa ser múltiplo?

​           E escapá-la envolve senão a nos vermos melhor, a pelo menos não nos vermos tão como vítimas, mas como autores da nossa própria fatalidade. A fatalidade de como nos relacionamos e o lugar que escolhemos permanecer ocupando nas nossas relações nos diversos contextos da vida cotidiana. Será que conseguimos sair desse maldito círculo? Ou desejamos interpretar papeis em grandes e trágicos romances?Resistimos para que a dor seja ainda mais sublime e o romance ainda mais trágico?

 

 

ADEUS, PRIMEIRO AMOR

Mia Hansen-Løve - 2011 - 105 min.

 

Sinopse: Camille (Lola Créton) e Sullivan (Sebastian Urzendowsky) vivem pela primeira vez a sensação do amor. O casal tem um relacionamento inocente, despretencioso e maduro para a idade deles. Quando Sullivan decide deixar o país os sonhos de ambos caem por terra, fazendo-os sentir um tipo de dor até então desconhecida.

2.

Adeus, primeiro amor - domingo dia 23.4 às 19 horas - ENTRADA E LIVRE - TRIBUNA LIVRE CULTURAL

Âncora 1
3.

Sukiyaki Western Django - domingo dia 28.4 às 19 horas - ENTRADA E LIVRE - TRIBUNA LIVRE CULTURAL

 

 

TAKASHI MIIKE – OU O CINEASTA QUE EU QUERO SER QUANDO CRESCER
 

por

Christian Caselli

(cineasta)

    

 

 

 

 

 

 

 

 

                                                               

                                                                                 still do filme

 

 

          Takashi Miike nasceu em 24 de agosto de 1960, em Osaka, Japão. Ou seja, Takashi Miike tem, por enquanto, 56 anos. E, desde seu debut, em 1991, Takashi Miike fez mais de 100 longas-metragens. Sim; é isso mesmo que você leu. E, para se ter uma ideia, sua fase mais produtiva e aclamada foi em 2001 e 2002, quando ele dirigiu, somados, 15 longas. Sim, Takashi Miike faz até Fassbinder parecer um autor preguiçoso.                                          

        Você pode estar pensando que tal japa é um cineasta conceitual, uma espécie de Andy Warhol nipônico e contemporâneo, que faz obras observacionais , onde o nada (ou o quase nada) acontece. Negativo. Takashi Miike faz um cinema narrativo extremamente provocador, capaz de gerar angústia até na pessoa mais fria e calculista. O que não falta em sua filmografia é uma gigantesca dose de violência e sangue, em que ele estabelece uma espécie de relação quase sado-masoquista com o espectador. E também não se trata de uma obra fácil, com vilões malvados e mocinhos vingativos: a grande maioria de seus personagens possui um caráter extremamente ambíguo, o que torna seus enredos ainda mais ricos (e angustiantes). Basta citar aquele que talvez seja o seu filme mais célebre, “Ichi, The Killer”, em que o sanguinário protagonista-título desperta mais pena do que ódio. E dentre suas perversões e preferências, Miike fez inúmeros filmes de Yakuza e até mesmo épicos de samurais. Sim, ele teve tempo para fazer épicos (veja, por exemplo, o ótimo “13 Assassinos”).

             E como apresentar tal controverso autor para a “good vibe” cidade de Lumiar? Como introduzir o público a um universo tão particular como o deste cineasta? Eu poderia ter optado por dois de seus grandes clássicos, o citado “Ichi, the Killer” ou o aclamado “Audition”, um filme de amor que se torna um pesadelo sem precedentes, mas decidi exibir um exemplar inusitado: “Sukiyaki Western Django”, de 2007. O filme é uma homenagem ao spaghetti western (especialmente à trilogia dos dólares de Sergio Leone) e, claro, ao original “Django”, de Sergio Corbucci (1966), passando também pelos filmes de samurai, especialmente “Yojimbo”, de Akira Kurosawa. Ou seja, se você nunca viu um faroeste japonês na vida, prepare-se para tal experiência.

 

                                                                 

                                                                                                     still do filme

        Vale dizer que “Sukiyaki” veio antes do sucesso “Django Unchained”, de Quentin Tarantino (2012). Aliás, tal aclamado diretor estadunidense é fã declarado de Takashi Miike, inclusive sendo ator e o narrador deste filme em questão. E este “Django” japonês foi o primeiro longa totalmente rodado em inglês por Miike e, diz a lenda, que os atores penaram para tal.

Espero que este seja então um divertido primeiro contato com o “exagerado” cineasta nipônico. Não deixem de pesquisar e conhecer melhor a sua obra.


 

 

 

 

 

 

 

                                                                     

                                                                 

 

                                                                     still do filme

 

 

 

SUKIYAKI WESTERN DJANGO
Direção: Takashi Miike. Japão, 2007, 121 min. Com Hideaki Ito, Koichi Sato, Quentin Tarantino

SINOPSE: Centenas de anos depois da Batalha de Dannoura (1185), em um remoto vilarejo japonês na montanha, a tensão se reinstala. A gangue de branco Genji, ligada ao clã Minamoto e liderada por Yoshitsune, e a gangue de vermelho Heike, do clã Taira chefiado por Kiyomori, entram em confronto brutal por causa de rumores de que por ali havia ouro. Quando um forasteiro sem nome, marcado por um passado negro e dono de notáveis habilidades com armas, chega à cidade, agora um vila fantasma, as gangues rivais especulam qual lado ele escolherá. Lutas de poder, traição, luxúria e amor cobrem a terra com sangue, e a histórica rivalidade dos clãs parte para uma selvageria típica dos "macaroni western", como são conhecidos os "spaghetti western" no Japão. Extravagante e num tom cômico negro e surreal, o filme bebe na fonte dos faroestes italianos.

Âncora 2
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