Cinescópio Dois - Setembro\Outubro de 2016
2001, 1968, 1962, 1969, 1951, 2016...
"Por que, [você] pode perguntar para si, [você] deveria se preocupar em escrever uma grande sinfonia, ou se esforçar para sobreviver, ou até mesmo para amar o outro, quando [você] não é mais que um micróbio momentâneo num grão de poeira girando através da
imensidão inimaginável do espaço?"
Somos chamados: este é o único jeito, eu acho, de abrirmonos para a potência de seguir. De maneira consciente ou insconsciente. Não precisamos entender a lógica ou a razão
do chamado; em certas situações, basta uma nota de música. Uma respiração. Basta um segundo. Somos afetados.
still de 2001
"Partimos por sobre este novo mar porque há novos
conhecimentos a serem ganhos, e novos direitos a
serem conquistados, e eles devem ser conquistados e
usados para o progresso de todos os povos."
Eis que o ambiente torna-se escuro. À primeira vista, os
olhos têm seu descanso: são agora os ouvidos que dão
conta do mastro e das velas da nossa embarcação. A
música das águas governa o manejo do leme. Uma voz nos
chega de um objeto que desconhecemos, numa região que
não mapeamos antes de cerrar as pálpebras: "Seria aqui a
relação da água com a vida que o autor queria explicitar?" O
autor está ausente. O autor é quem lê. Não demora e os
olhos também se impõem: estão ali para ver. Somos
levados a retomar.
"Este é um pequeno passo para um homem, mas um
salto gigante para a humanidade."
still de 2001
Voltar ao tempo antes de nós. Voltar ao planeta dos
macacos. Deixar de lado a corrida espacial, as guerras e os
triunfos; deixar de lado a domesticação dos corpos, a falsa
igualdade e a exploração; deixar de lado a fome. Voltar
aonde nunca nos deixamos estar e, neste lugar, criar um
berço.
INTERMISSÃO (duração: 1 min.)
Explosão de luzes. Linhas, dimensões, distâncias que não
podemos medir em ângulos que pouco entendemos. É a
experiência do impossível – não. É algo intensamente real e
me sinto presente. Presenciamos o carinho compartilhado
entre uma macaca mãe e seu filhote sob o pôr-do-sol.
Planetas ao nosso redor; estrelas que antes eram só
distância. É seguro observar. Visitamos a Lua e nos vemos
voando pelo espaço. Cada espaço nos oferece seu tipo de
luz frente à escuridão plena do universo. E há incontáveis
outros universos, incontáveis estrelas e mundos... Suas
luzes entram por rachaduras como as de nossos olhos, ou
por telescópios, ou até de forma mais simples, pelo ato
político que é imaginar, ou por formas que ainda não
conseguimos ver.
"Então, quase certamente existe Terra suficiente no céu
para dar a cada membro da espécie humana, desde o
primeiro homem-macaco, seu próprio paraíso – ou
inferno – do tamanho de um mundo."
Vislumbramos a escuridão. O incerto. O desconhecido. É
inevitável sentir o desconforto: eu o sinto. Até que vem o
novo. Eu o sinto também. Eu me certifico que sinto. Eu o
conheço. Apenas aterrorizo-me quando percebo que o novo
o certo o claro o conhecido tem uma coisa que estava lá
desde o início, desde que eu havia dado o primeiro
vislumbre, e eu não tinha notado. Por que temos o hábito de
olhar sem ver? Continuo sentindo, e talvez nada tenha
acontecido de diferente, vendo deste ângulo.
still de 2001
"Você precisa entender que até aquele preciso momento
eu estava quase completamente convencido de que não
podia haver nada de estranho ou incomum para se
achar ali. Quase, mas não de todo; era aquela dúvida
inquietante que me havia feito seguir em frente. Bem,
não havia mais dúvida, mas a inquietação mal havia
começado."
Hugo da Costa
terráqueo aspirante a bibliotecário
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2001: UMA ODISSEIA NO ESPAÇO
dirigido por Stanley Kubrick; escrito por Stanley Kubrick e Arthur C.
Clarke; com Keir Dullea, Gary Lockwood e William Sylvester.
Estados Unidos e Inglaterra. MGM: 1968 \ 149 min.
Inspirado no conto "O sentinela", de Arthur C. Clarke, entre outros,
Kubrick pretendia encontrar um "tema de grandeza mítica". Seus
achados são explorados visualmente e musicalmente neste que é o
11º sob sua direção. Em quatro atos (três apresentados por títulos),
viajamos no tempo desde a descoberta da técnica até a ascensão
do humano para o espaço em missão para Júpiter. Lançado um ano
antes da viagem de da Apollo 11, ele continua atual durante todo o
meio século que vem se estendendo. Exploração, tecnologia, o que
é ser humano e mais do que o verbo pode aqui descrever são
temas extraídos da intensa experiência sensorial do filme.